Quando uma pessoa está perdida a procura de um tarólogo é como se ela caminhasse por entre uma noite repleta de luas. Tudo está escuro e ameaçador mas cada lua promete uma luz, um recanto, alento. A questão é que cada lua é uma fase, algumas são crescentes, outras cheias, outras são novas. Cada tarólogo uma lua misteriosa.
Alguns vão te prometer milagres, vão falar de recuperar a pessoa amada, outros vão dizer do seu sétimo chakra e como virar um cavaleiro do zodíaco e vão ter aqueles que, bem, vão embaralhar 78 cartas e olhar o seu momento e tentar te guiar da melhor forma possível. Orai a vigiai, caros estudantes e consulentes, quem promete muito provavelmente vai entregar pouco e te fazer sair com o bolso muito mas muito vazio.
Eu li a história esses dias da cigana que extorquiu em mais de 80 mil uma vítima e eu só penso: se essa pobre coitada que perdeu milhares de reais tivesse mais embasamento do que as cartas podem realmente fazer, será que isso teria acontecido?
Os clientes que tem pouco conhecimento do que realmente é o Tarô pensam que todo tarólogo é um ser de luz radiosa que passa seus dias meditando e influenciando o movimento das marés, tendo telepatia, telecinésia e sendo membro dos X-Men. Que com as cartas a gente dá uma de Gambit e manipula energia cinética. E também pensa que todos nós somos perfeitos e extremamente éticos, nos alimentamos por meio de fotossíntese e podemos te amaldiçoar até a vigésima geração. Quem me dera, hein.
Não gente, pelamor: tarólogos, astrólogos, oraculistas num geral são só umas pessoas que estudaram por anos o oráculo de sua preferência e assim compreenderam seu funcionamento de forma a ajudar o próximo.
Nenhum de nós vai te ensinar amarração pra recuperar a pessoa amada nem uma maldição cigana pra acabar a vida da sua vizinha fofoqueira. Não, a gente sequer é uns seres de luz perfeitos e tal. Todo dia a gente come e horas depois tem que ir no banheiro. E se a gente não tomar banho a gente vai feder. E podemos ser extremamente falhos moralmente porque entender uma arte oracular não significa que estamos acima da moralidade. Não, eu sou uma pessoa cheia de defeitos, eu tenho distúrbios emocionais, eu tomo antidepressivo e eu mal sei minha preferência religiosa porque ser um oraculista não necessariamente me torna baluarte de alguma religião.
É preciso aprender que quem joga Tarô pode te oferecer só uma coisa: as cartas. Você vai, marca uma consulta, nós vamos usar nosso conjunto de arcanos pra responder suas perguntas e aflições, tentando ver soluções para seus problemas a partir das cartas. Não vai ter magia, não vai ter chakras, não vai ter cavaleiros do zodíaco, não vai ter X-Men nem Alice no País das Maravilhas. O que vai acontecer é um diálogo por intermédio das cartas, ponto.
Não necessariamente todo oraculista vai ser assim. Alguns tem realmente abordagens mais místicas e ocultistas, mas uma coisa é certa, se essas abordagens prevalecerem mais do que as cartas na consulta, tem caroço nesse angu. Se a pessoa quer que você pague 1000 contos porque você tá com um obsessor e tá sendo perseguido pelo Conde Drácula, você corre. Se a pessoa te amaldiçoar se você não for consultar de novo, você denuncia, processa. Se a pessoa te cobrar uma parcela de um iate pra fazer uma consulta de duas horas, pelamor de Deus né, tem pessoas que trabalham com seriedade e que cobram no máximo máximo 400 reais numa consulta completa.
É preciso desmistificar o papel do oraculista, tirá-lo desse céu pré-concebido, desse misticismo que o público cria sobre eles. Quem realmente trabalha com seriedade é acima de tudo humano, falho, que come, caga, chora, sofre, fica doente, sofre por ex ou por crush, assiste sitcom quando tá deprimido, fala merda às vezes, por aí vai.
Não somos santos, não temos telecinésia e não vamos psicografar uma mensagem do Tim Maia pra você. Quem se pinta de messias sempre acaba sendo os falsos profetas. Não sou santo nem quero ser, porque pra ser oraculista a gente tem que ser acima de tudo humano, demasiado humano.
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