Sobre o estudo oracular
“Mente zen, mente de principiante”. Esta sentença é o título de um livro do filósofo-monge Shunryu Suzuki. Vivemos uma cultura onde as pessoas acreditam sempre estar progredindo, se tornando mais sábias depois de ler livros e livros, concluir faculdades, mestrados, doutorados. Mas não seria isso tudo tolice? A grande sabedoria reside em dar-se por eterno iniciante como naquele dito socrático de só saber que nada se sabe. O mestre zen contempla a natureza sempre como algo novo e por isso se posiciona como eterno noviciado. Sempre a primavera, nunca as mesmas flores, diriam ao observar uma mesma árvore que diariamente contemplam.
E acho que nisso tudo reside um saber fundamental no estudo oracular: a humildade de saber-se nada frente ao infinito plural dos saberes. Transliterando o dito oriental: sempre os mesmos símbolos, jamais as mesmas ideias. Tudo dependerá do contexto, da hora, do tempo e espaço precisos ao qual situamos os arcanos. Certamente às vezes até o mais sabido dos oraculistas vai se surpreender ao ver as cartas agirem de uma forma que ele nunca premeditou. Os símbolos são eternos porém fluidos, se adequam aos contextos, dançam nas tramas mundanas, transfiguram-se como um Cristo-Moisés-Elias.
Por isso não me tomo como senhor de nenhum saber, mas eterno aprendiz. E isso não significa contudo que não sei coisa alguma. Somente significa que nunca saberei tudo. Não cabe a nós querer isso. Se tentássemos ler todos os livros que são publicados em um ano levaríamos oitenta anos pra isso. Não somos capazes de agregar todos os saberes. Somos o eterno principiante. Mas podemos aprender algo, sempre algo.
E o meu conselho é estar aberto, é andar andarilhamente, eterno Louco abraçando abismos e montanhas: o estar eternamente receptivo a tudo e a nada. O saber dos oráculos se faz acima de tudo na experiência, no caminho que se elabora neles. Por isso eu digo que para além do estudo, devemos praticar. Me perguntaram esses dias agora o que eu penso sobre jogar Tarô sem cobrar e eu disse que é acima de tudo uma opção mas que no caso de alguém que começou agora os estudos é realmente apropriado não cobrar porque certamente a pessoa não está pronta pra isso ainda. Ela precisa ler sobre os trunfos e naipes, precisa jogar as cartas, observá-las tomando a forma na experiência de estar frente ao outro, precisa entender as coisas e só então, sabendo-se ainda principiante mas contudo já tendo saberes, ela pode decidir cobrar pelo conhecimento que já agrega. Mas a questão é sempre saber-se principiante até mesmo ao saber algo.
Acho que a coisa mais linda no ato do eterno aprendizado é que impedimos o nosso ego de querer falar mais do que realmente sabemos. Por anos eu estudei os arcanos essencialmente online, sem livros, sem nada. Sequer me atentava a saber a origem das cartas, eu queria era entender as imagens. Mas eu estava tão concentrado em entender as imagens que eu não perdia tempo dizendo a balela que tarô vinha do Egito porque eu nem sequer queria saber da origem das cartas, eu nem me atentava a isso na minha inocência de aprendiz.
Hoje eu sei a origem europeia e posso argumentar sobre o assunto, explicar a pessoas que desconhecem, mas a questão é, eu sempre fui mais receptivo a saber as coisas do que forçá-las. A todo momento minhas opiniões sobre os arcanos, sobre meus conhecimentos oraculares e místicos muda. Se alguma pessoa mais sábia que eu me dá uma informação nova, eu não rejeito, eu escuto e absorvo. Porque é isso, nada sei, sou eterna tabula rasa, quadro em branco que posso apagar, reescrever, rasurar vez e outra mas sempre agregar algo novo. Humildemente por isso digo a todos que procuram o saber oracular: mente zen, mente de principiante.