Certa feitapedi dois conselhos para mim no tarô. Em ambos me saiu a carta dA Morte. Logo a temida dona do fim. Eu poderia ter sido tomado por um assombro, um trovão de calamidade mas, num conselho, você precisa se trajar como o Arcano, obedecer seus domínios. Adornar-se de Morte é ser quem está para além do medo.
Morte, o Arcano sem Nome. Ninguém precisa ouvi-la para saber o que ela representa. A foice diz tudo. Vem como uma sombra e corta na meia-noite da alma. Ser a Morte é ser destemido, é não ter medo, é causar medo por onde passa. É ser maior que a vida, porque, afinal, a subtrai.
E viver, é, afinal, morrer, a todo instante. Abandonar a pele como fazem os répteis, e renascer a todo instante. E morrenascer. E nascer morto. Morrer vivo. Morreviver. Somos tudo aquilo que deixamos de ser. Toda ausência, todo substrato, sangue, fezes, lágrima, detritos. Somos. Porque deixamos de ser.
Eu acredito que uma pessoa só existe após morrer, porque enquanto está viva, não completou-se. Ainda não foi tudo que podia ter sido. Mas ao morrer, não se pode ser nada além do que foi. Na morte não existe redenção. Todos vão pro mesmo solo, mesmo berço comum ou, como cantava Augusto dos Anjos:
"E haja só amizade verdadeira
Duma caveira para outra caveira,
Do meu sepulcro para o teu sepulcro?!"
Na Morte, contudo, existe a coragem do usufruto da própria vida. Buscamos ser melhores em vida para não sermos esquecidos no fim. Não queremos o oblívio. Então morrer é matar a nossa pior parte e viver com aquela que é mais pura, bem dizia Hamlet para a própria mãe no ápice da peça.
No primeiro conselho me surgiu A Morte com o Cavaleiro de Espadas. Matar com palavras, matar de forma precisa, matar com palato e ímpeto da tempestade. A Morte trajada no Cavaleiro de Espadas é a Morte cavaleira do apocalipse, prenúncio de medo e terror. A imbatível, destemida, imparável. O Tarô me pediu pra ser guerreiro como a Morte de Espadas. Enfrentar tudo como a Morte tudo enfrenta e sai vencedora, porque não morre aquilo que só pode matar.
Depois perguntei das coisas do coração, me veio a Morte e o 9 de Espadas. E eu entendi, eu entendi. Mate o medo, mate a angústia, mate o que em você treme fronte a face da caveira.
Quem ama beija a boca da Morte e não se importa. Quem ama morre sempre que vem a taquicardia. Porque morrer, sofrer, faz parte, é tutano.
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